Escola é condenada a indenizar mãe de criança que foi expulsa por ser autista

 

Emerson Maia Damasceno*

advogado e sócio da Emerson Damasceno Advocacia

 

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Mais uma decisão do Judiciário ajuda na luta contra o capacitismo na educação.

Em Aparecida de Goiânia, uma escola na Região Metropolitana da capital de Goiás, foi condenada pela Justiça a pagar uma indenização de R$ 7 mil à mãe de uma criança autista. A expulsão da criança ocorreu apenas 15 dias após sua matrícula na instituição. O juiz que proferiu a sentença destacou que os depoimentos do diretor da escola e de uma professora, apresentados durante o processo, equivalem a uma admissão de que eles não estavam preparados para lidar com a gravidade do quadro da criança após a matrícula, levando à decisão de romper o vínculo escolar.

O juiz enfatizou a condenação ética da escola por sua escolha de encerrar o vínculo com a criança, o que resultou em uma forma velada de discriminação que certamente afetou emocionalmente a mãe. O documento judicial também mencionou que a escola admitiu ter conhecimento do autismo da criança através das informações fornecidas pela mãe e da documentação da menina. A decisão do juiz, datada de 21 de agosto, detalha que a criança foi matriculada em 31 de maio de 2021 e expulsa apenas 15 dias depois.

O juiz esclareceu no documento que a mãe relatou ter sido informada pela direção da escola de que a criança não poderia continuar na instituição devido a comportamentos disruptivos, como atrapalhar as aulas, não dormir durante o período de descanso dos colegas e gritar, o que perturbava os vizinhos da escola.

Inicialmente, a escola tentou justificar a expulsão alegando que o motivo era o comportamento pouco colaborativo da criança e atrasos frequentes na busca pela filha, que excediam o horário de encerramento das atividades. No entanto, o magistrado observou que não havia evidências no processo para respaldar essa alegação. Além disso, a escola não forneceu registros dos atrasos ou advertiu a mãe, seja por escrito ou eletronicamente, de que tais condutas poderiam resultar na rescisão do vínculo escolar.

A sentença estabelecida pela Justiça Cível visava principalmente compensar o dano moral sofrido tanto pela mãe quanto pela criança. Não incluiu, no entanto, o pedido original de pagamento de uma multa nos termos do artigo 7º da Lei nº 12.764/2012, que estabelece penalidades para gestores escolares ou autoridades competentes que recusem a matrícula de alunos com transtorno do espectro autista ou outras deficiências. O juiz explicou que essa multa é uma penalidade administrativa que pode ser aplicada após um processo extrajudicial de apuração da conduta da escola.

 

Essa e mais decisões recentes vêm construindo um arcabouço jurisprudencial que certamente irá socorrer pessoas autistas e como demais deficiências, como também seus familiares, quando a exclusão - seja ela escolar, na saúde ou em outras áreas - ocorrer. A não conformação com essas atitudes, seja via judicialização ou outra forma de denúncia, tem se mostrado um capítulo importante na luta das pessoas com deficiência.

 

*Emerson Damasceno é advogado, sócio do Escritório Emerson Damasceno Advocacia e atualmente preside a Comissão Especial de Defesa da Pessoa autista do Conselho Federal da OAB e também a Comissão Estadual de Defesa da Pessoa com Deficiência da OAB-CE.

 

 

 

Tribunal de Justiça do Ceará determina que Unimed forneça tratamento para criança autista em SP

 

Emerson Maia Damasceno*

advogado e sócio da Emerson Damasceno Advocacia

 

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O Tribunal de Justica do Estado do Ceará emanou impartante julgado, em caso sobre direito de pessoas autistas e com demais deficiências o qual constitui mais uma nova jurisprudência que versa sobre o acesso à saúde e direito à vida, ante negativas ilegais de cobertura por parte de planos de saúde.

 

Na referida decisão, o Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) emitiu uma determinação que exige que a Unimed Fortaleza assegure o acesso a cuidados médicos para uma criança autista do Ceará, que também apresenta uma malformação vascular. Esse tratamento deve ser realizado em um hospital especializado em São Paulo, que é um centro de referência para essa condição. A criança já estava passando por tratamento na mesma unidade, mas esse processo foi interrompido devido a alterações no plano de saúde.

Vale transcrever a EMENTA do julgado:

 

"EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. OPERADORADE PLANO DE SAÚDE. PACIENTE DIAGNÓSTICADO COM TRANSTORNO DOESPECTRO AUTISTA(CID 10: F84.0) E MALFORMAÇÃO VASCULAR EXTENSA DE SEGMENTO CEFÁLICO DE ORIGEM CONGÊNITA, EXTENSA, COM PREDOMÍNIOLINFÁTICO MACRO E MICROCÍSTICO, LOCALIZADA NA REGIÃO CERVICAL E FACE. TRATAMENTO DE SAÚDE. AUSÊNCIA DE REDE CREDENCIADA APTA APRESTAR O TRATAMENTO RECOMENDADO. POSSIBILIDADE, POR EXPRESSAPREVISÃO NA LEI ESPECIAL DE REGÊNCIA. TRATAMENTO EM HOSPITAL SITUADO NA CAPITAL DE OUTRO ESTADO. TEMA PACIFICADO NO ÂMBITO DOSTJ. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL. REEMBOLSO INTEGRAL. RECURSO CONHECIDOE DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA MAJORADOS.

1. De início, destaco que o Código de Defesa do Consumidor se aplica ao caso concreto emrazão da relação consumerista havida entre as partes, de modo que as cláusulas contratuais necessariamente devem ser interpretadas de forma mais favorável ao consumidor, sendo nulas de pleno direito as que se caracterizarem abusivas (Enunciado de Súmula nº 608, do STJ; arts. 47 e 51, do CDC).

2. O cerne da controvérsia gira em torno da autorização quanto ao tratamento ou procedimentos executado por profissionais em estabelecimentos não credenciados ao plano de assistência médica, mesmo existindo prévia prescrição do profissional de saúde.

3. O entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça é o de que os procedimentos realizados em hospitais e por profissionais não integrantes do contrato de saúde somente são de responsabilidade do plano de saúde em casos especiais, como, por exemplo, quando inexiste estabelecimento adequado no local ou quando o hospital conveniado ao plano de saúde se recusa a aceitar o paciente, ou, ainda, diante da emergência da internação. Não sendo reconhecidas tais situações excepcionais no caso concreto, é de rigor limitar a obrigatoriedade da cobertura do plano de saúde apenas às despesas realizadas nos termos do contrato.

4. Nesse sentido, observo que há vasta documentação médica, inclusive emitida por profissionais credenciados pela operadora de saúde requerida, dentre outros, que expressamente indicam o hospital A.C. Camargo Câncer Center como o local mais indicado e seguro para o tratamento da infante, por ser serviço de referência em anomalias vasculares, ante a necessidade desta ser assistida por equipe multidisciplinar experiente para a patologia. Atesta-se ainda que a região do Cariri não possui centro adequado para o seguimento do tratamento. Nesse sentido, cito os relatórios médicos de fls. 86, 87, 88/91, 92, 93 e 94. 

5. Dessa forma, entendo que a ré, ora apelante, não conseguiu afastar sua incumbência atribuída pelo inciso II do art. 373 do CPC, pois em nenhum momento comprovou que possuía na sua rede credenciada no Estado Ceará, bem como em sua rede no Estado de São Paulo, profissionais aptos para o tratamento da filha da apelada.

6. Recurso conhecido e desprovido. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, à unanimidade, em conhecer do recurso interposto, para negar-lhe provimento, nos termos do voto do relator."

 

 

A Decisão, cuja relatoria coube ao eminente Desembargador Relator Raimundo Nonato Silva Santos, pertencente à 1ª Câmara de Direito Privado do TJCE, aconteceu em 9 de agosto e foi divulgado publicamente na segunda-feira passada, 28.

Durante os encontros médicos no Ceará, os profissionais recomendaram que a criança continuasse o tratamento com especialistas em São Paulo, que já estavam familiarizados com o caso. Contudo, a Unimed Fortaleza recusou esse pedido. Diante dessa situação, a mãe da criança decidiu iniciar um processo judicial.

No decorrer do processo, a Unimed Fortaleza argumentou que o hospital mencionado não fazia parte de sua rede credenciada, o que resultaria em custos significativos para a operadora, incluindo passagens aéreas, acomodação, honorários médicos e internação em instalações e com profissionais não afiliados.

A operadora de saúde também afirmou que a mãe não havia apresentado evidências de que o tratamento não estava disponível na rede local credenciada, ou de que não havia capacidade para realizar o tratamento.

De acordo com as informações do processo e a própria decisão, documentos médicos foram incluídos no processo, nos quais profissionais credenciados da Unimed recomendavam o tratamento no hospital de São Paulo como a opção mais adequada e segura para a criança.

Já em janeiro deste ano, a Unimed Fortaleza foi condenada em primeira instância a fornecer e reembolsar integralmente o tratamento conforme o prescrito pelo laudo médico, por meio do hospital e profissionais que já cuidavam da paciente. Além disso, a sentença ordenou o reembolso das despesas relativas a consultas particulares.

A operadora recorreu da decisão ao Tribunal de Justiça do Estado, sustentando que a paciente estava recebendo atendimento de acordo com o plano de saúde contratado, portanto, não tinha obrigação de cobrir os custos de um tratamento realizado em um hospital não credenciado.

A operadora também buscou reaver os pagamentos feitos à cooperativa. No entanto, após uma avaliação minuciosa do caso, a 1ª Câmara de Direito Privado confirmou a decisão de primeira instância, respaldando o voto do desembargador Raimundo Nonato.

Vale ressaltar que se trata de mais uma decisão importante para pessoas autistas, familiares e quem milita pelo direito á saúde. Nesse caso específico - como em diversos outros - somente após a judicialização existe a prestação contratual adequada por parte dos planos de saúde. 

É de se ressaltar que o Judiciário vem, em muitos casos, atendendo ao que determina a legislação e jurisprudência consolidada, seja em primeira ou segunda instâncias, a fim de que as operadores de saúde suplementar cumpram com as suas obrigações contratuais. 

 

*Emerson Damasceno é advogado, sócio do Escritório Emerson Damasceno Advocacia e atualmente preside a Comissão Especial de Defesa da Pessoa autista do Conselho Federal da OAB e também a Comissão Estadual de Defesa da Pessoa com Deficiência da OAB-CE.

STJ: Plano de Saúde Responsabilizado por Negar cobertura a Autista

Data da publicação do texto: 22/08/2023

 

Emerson Maia Damasceno*

Advogado e sócio da Emerson Damasceno Advocacia

 

Brasília-DF: Uma decisão importante, emanada pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é mais um capítulo na batalha judicial dos autistas e suas famílias pelo acesso a tratamentos essenciais, garantidos por Lei. O tribunal decidiu de forma unânime que a recusa indevida a exames e terapias para pessoas autistas, gera direito a indenização por danos morais. Essa determinação, consolidada após julgamento na quarta turma do STJ, amplia os direitos e a proteção das pessoas autistas.

 

Assim se posicionou o Superior Tribunal de Justiça através de sua quarta turma:

 

"AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE. PACIENTE DIAGNOSTICADO COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ARTIGO 1.022 DO CPC/2015. NEGATIVA DE AUTORIZAÇÃO DE EXAME DE SEQUENCIAMENTO DE EXOMA COMPLETO. RECUSA INDEVIDA. SÚMULA 83/STJ. DANO MORAL CONFIGURADO. PRECEDENTES DO STJ. VALOR RAZOÁVEL. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Não se verifica a alegada violação do art. 1.022 do CPC/2015, na medida em que a eg. Corte Estadual dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas. 2. "A Segunda Seção desta Corte, no julgamento dos EREsp n.º 1.889.704/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, julgado aos 8/6/2022, reafirmou o dever da operadora do plano de saúde em custear, de forma ilimitada, as sessões de tratamento para os beneficiários com diagnóstico de 'Transtorno do Espectro Autista' (AgInt no AgInt no AREsp 1.696.364/SP, Relator Ministro MOURA RIBEIRO, Terceira Turma, julgado em 29/8/2022, DJe de 31/8/2022). 3. Nas hipóteses em que há recusa injustificada de cobertura, por parte da operadora do plano de saúde, para o tratamento do segurado, causando-lhe abalo emocional, esta Corte Superior admite a caracterização de dano moral, não se tratando de mero aborrecimento. Precedentes. 4. O valor arbitrado pelas instâncias ordinárias a título de danos morais somente pode ser revisado, em sede de recurso especial, quando irrisório ou exorbitante. No caso, o montante fixado em R$ 10.000,00 (dez mil reais) mostra-se proporcional e adequado, em razão da "recusa em autorizar o exame médico objeto da lide, em paciente, criança com 02 (dois) anos de idade, portadora de autismo" (e-STJ, fl. 540). 5. Agravo interno desprovido." Acórdão unânime da quarta turma do Superior Tribunal de Justiça -  AgInt no AREsp 1970665 / RJ - julgamento: 17/04/2023 data publicação: 03/05/2023 . Relator Ministro Raul Araújo.

 

Dessa forma, a negação de tratamento sem justificativa é considerada uma conduta ilegal por parte dos planos de saúde. A decisão da quarta turma do STJ ressaltou que tal atitude gera direito a indenização, não sendo um mero aborrecimento, caracterizando sim um dano moral.

 

O caso discutido no julgamento envolveu a recusa de um exame de sequenciamento de exoma completo para um autista, porém, essa decisão também representa mais uma importante jurisprudência com alcance mais amplo, podendo ser citada em outras terapêuticas negadas de forma injusta.

 

Nesses casos, a judicialização contra os planos de saúde, seja através de advogados e advogadas especialistas ou por meio da defensoria pública, contribui também para se construir um arcabouço jurusprudencial ainda mais sólido na busca pela inclusão e efetivação dos direitos das pessoas autistas e com demais deficiências.

 

*Emerson Damasceno é advogado, sócio do Escritório Emerson Damasceno Advocacia e atualmente preside a Comissão Especial de Defesa da Pessoa autista do Conselho Federal da OAB e também a Comissão Estadual de Defesa da Pessoa com Deficiência da OAB-Ce.

 

A DEFICIÊNCIA DAS COISAS

 

Nos dias atuais, grassam discursos que recorrem a termos modernos que remetem a gestão – de empresas, do estado (lato sensu), de pessoas – que sejam inclusivas, sustentáveis, socialmente responsáveis e outros adjetivos que buscam adornar o discurso. Discursos que sempre mencionam e dizem se preocupar com estruturas inclusivas para as pessoas com deficiência. Em quase sua totalidade as falas advêm de pessoas sem deficiência que pensam modelos para a sua realidade, visto que a sociedade continua a ser pensada e construída para elas, a despeito de toda evolução legislativa que já alcançamos.

Não há política pública para a inclusão de pessoas com deficiência, por exemplo, sem a sua efetiva participação através das entidades que nos representam, como determina a Constituição brasileira que internalizou ao nível de emenda constitucional, a Convenção Internacional da ONU sobre as Pessoas com Deficiência.

As gestões, no geral, são deficientes. Não as pessoas. Isso gera Cidades, Estados, um País deficiente. Empresas que não escutam e dão lugar de fala e decisão aos seus funcionários, parceiros, consumidores, à comunidade de pessoas com deficiência, são igualmente deficientes. Não as pessoas.

A falha grotesca que há, geralmente, nessa estrutura social que se acha no direito de pensar, propor e executar tudo para as pessoas com deficiência, advém do capacitismo estrutural que há nas sociedades.

O registro, entretanto, se faz necessário: deficientes são as estruturas, espaços, as políticas e seus gestores. Não as pessoas.

Dirigentes, públicos e privados, que se acham modernos e repaginados ao decorar os termos da moda, mas olvidam ao básico da nossa necessária representatividade e participação ativa, são deficientes. Não as pessoas.

As poucas exceções, a confirmar a regra, têm que ser destacadas. Programas como o Projeto Praia Acessível (para citar apenas um ótimo exemplo), fruto de uma parceria entre Prefeitura de Fortaleza e Governo do Ceará, que chega este ano a dez mil atendimentos, precisa ser elogiado.

A regra capacitista a ocorrer em todo o País, entretanto, deve ser igualmente exposta. Muito em breve não irão sobreviver aqui no Brasil as gestões que não se adequaram via D.E.I. (termo em inglês que se refere à diversidade, equidade e inclusão), E.S.G. (também em inglês se refere à governança social e ambiental) e outros parâmetros que impõem cada vez mais a responsabilidade social, ambiental e humana às gestões. Será difícil sobreviver também no capital aberto, cujo humor dos investidores é cada vez mais guiado por valores sociais, humanos e ambientais, ou mesmo se habilitar a receber loas pelo cumprimento do Protocolo 2030 da ONU e de demais organismos internacionais. Será cada vez mais difícil obter a atenção de fundos e linhas bilionários. Isso será implacável se as gestões – lato sensu – também não nos ouvirem e nos derem vez e voz.

Permanecerão cegas, mudas, aleijadas, doidas, surdas, autistas, para exemplificar aqui – com pesar – termos capacitistas e ofensivos que alguns ainda costumam nos dirigir. Elas assim permanecerão. Mas não nós, as pessoas.

 

Emerson Damasceno é paratleta e advogado, presidente da Comissão Nacional da Pessoa Autista do Conselho Federal da OAB e da Comissão Estadual da Pessoa com Deficiência da OAB-CE.

 

Clique aqui e confira o artigo publicado no Diário do Nordeste.

Dia Nacional da Pessoa com Deficiência, um dia de Luta, por Emerson Damasceno

 

 

Em setembro, ao demarcar o dia Nacional de Luta, as pessoas com deficiência reforçam que se trata de um dia de luta e reinvindicação e não um dia para se comemorar.

Luta porque ainda há inúmeras barreiras impostas pela vida em sociedade ante a inércia das estruturas estatais. Dia de reivindicação, tendo em vista que não se trata de um movimento estanque, ainda há muito a ser conquistado, em especial no que tange à representatividade.

Trata-se de uma luta que deve ser protagonizada por pessoas com deficiência – seja física, sensorial, mental, intelectual – visto que somos nós que sofremos na pele a dura realidade imposta pela discriminação e por várias barreiras (urbanísticas, arquitetônicas, comunicacional, de transporte etc.). Além do que não se pode admitir esse debate sem nossa efetiva participação.

O que causa um temor justificável atualmente são também os ataques e ameaças constantes a direitos já consolidados – como o BPC (Benefício de Prestação Continuada) – por parte de um governo federal que, volta e meia, fala em diminuição de direitos.

Atualmente, somos cerca de um quarto da população, mais de 50 milhões de brasileiras e brasileiros com algum tipo de deficiência segundo o Censo de 2010, sendo que a sociedade em sua maioria esmagadora ainda não nos percebe como cidadãos e cidadãs, haja vista que a inclusão e acessibilidade são palavras distantes do cotidiano de uma grande maioria que não percebe nossa existência.

Muito embora nas duas últimas décadas tenham ocorrido conquistas importantes, a sua manutenção é crucial, a fim de reduzir as barreiras e nos colocar em uma mínima situação de igualdade.

Essa evolução necessária irá também ao encontro do conceito de uma sociedade mais evoluída, haja vista que não podemos falar em cidadania em uma sociedade que não acolhe todos em sua rica diversidade. Lutar pelos nossos direitos e conquistas não é um favor, é um direito já consolidado na legislação brasileira.

A luta contra o capacitismo e preconceito deve ser uma constante também para pessoas sem deficiência. Somente assim poderemos um dia demarcar o dia 21 de setembro também como motivo para comemoração. Até lá, seguiremos lutando!

*Paratleta, presidente da Comissão de Defesa da Pessoa com Deficiência da OAB-CE e membro da Comissão Nacional PCD do Conselho Federal da OAB

Texto originalmente publicado em Jornal O Povo, em 21 de setembro de 2020